Por trás das lentes, um olhar sensível sobre o Barreiro, sua gente e sua natureza

“Eu buscava imagens do bairro. Eu procurava no Google, em fatos históricos da cidade de Belém, e eu não encontrava. Só encontrava coisas sobre o crime, coisas negativas”. Quantos moradores da periferia não se sentem exatamente assim, invisibilizados ou retratados a partir do estereótipo da criminalidade e do descaso do poder público?

A fala é de Iago Barbosa, o Awazônia, ao relatar como surgiu o seu interesse pela fotografia. Ele queria encontrar imagens que mostrassem o Barreiro como ele realmente é. Como não achou, começou sua aventura pela arte de fotografar para construir ele mesmo um olhar positivo sobre o bairro. “Eu resolvi comprar uma câmera para fotografar o bairro onde eu moro, especificamente o rio São Joaquim (que transformaram num canal, mas é um rio). Eu comecei a entender a importância que tem o canal, o bairro, assim como outras periferias de Belém”, comenta o jovem.

Imagem: Acervo pessoal Awazônia

Essa ausência de imagens revela também que muitas vezes o que é mostrado na imprensa e disseminado por quem é de fora esconde toda a diversidade e as riquezas da periferia. “A fotografia me fez registrar e passar para as outras pessoas que ali não é só um local de coisas ruins, assalto etc. Ali é um local artístico, com uma área florestal que está resistindo até hoje, com esse povo que batalha todo dia para se manter vivo e resistente”, comenta Iago sobre o sue bairro.

 

Percurso artístico

Do menino que via sua mãe costurando e começou a fazer seus próprios bonecos de tecido, passando pelos aprendizados no Curro Velho, onde aprendeu alguns fazeres artísticos, até chegar ao jovem artista e fotógrafo, o percurso revelou que, mais do que conhecer a técnica, é importante ter um olhar sensível sobre a sua realidade.

“A fotografia começou como uma experimentação, porque eu nem sabia como funcionava o equipamento. Mas eu tinha a vontade de fazer, então comecei a experimentar. Errando bastante”, relembra.

Imagem: Deco Barros

Hoje o experimental se consolidou nas fotografias e colagens do Awazônia, mostrando que as pessoas, a cultura, a arte urbana e digital podem estar perfeitamente conectadas com a natureza. “Eu tenho muito essa conexão com a natureza. Sempre coloco algum tipo de coisa que vem da natureza, me faz bem fotografar o que é natural também. Todo mundo sabe que isso aqui na terra é só uma passagem e cada um conta uma história ou revela do que aprendeu no mundo, e através da imagem eu gosto de trazer essa humanidade. Gosto também de registrar pessoas e misturar as pessoas e os espaços onde elas habitam, trabalham, se relacionam”, revela o artista.

 

Por que produzir arte na periferia?

Por trás do fazer artístico do Awazônia, tem as lutas de alguém que sabe o que significa ser artista independente da periferia. “Eu e as outras pessoas que estão lá sabemos da importância da arte, que a arte salva, porque ela salvou a minha vida, mudou a minha vida, mudou a forma como eu vejo o mundo. Então acredito que vai mudar a vida de outras pessoas”.

A arte salva, mas para salvar, são necessários diversos movimentos e incentivos públicos que ainda não acontecem ou não são suficientes. Ele dá um exemplo que demonstra como a maioria dos espaços por excelência de produção e exposição de artes estão concentrados nos centros: “É preciso descentralizar, e levar as galerias [de arte] para dentro das periferias”, comenta.

Imagem: Acervo pessoal Awazônia.

Para Awazônia, ser artista na periferia também é uma forma de trazer à tona temas e denunciar violações de direitos que só sabe quem vive essa realidade. Por isso, ele não fica só na imagem, mas trabalha também com a palavra. “Eu acredito que a minha arte é um grito de liberdade, de dizer que eu estou existindo, que eu posso fazer arte, e que mesmo que queiram, não vão me calar. E é por isso que eu vou por vários segmentos, porque eu sei que a fotografia é importante, mas a palavra também é”, comenta.

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